quarta-feira, 31 de julho de 2013


quarta-feira, 31 de julho de 2013

 não mostrouPostado por Rosane Viana às 09:39





Os dias em que Deus confirmou sua existência para 3,5 milhões de jovens do mundo inteiro
Quem não pôde participar da Jornada Mundial da Juventude e teve de se contentar com as análises da mídia perdeu aspectos fundamentais desse evento que movimentou o país. É bem verdade que as lentes das câmeras conseguiram alcançar pontos importantes e, muitas vezes, belos da Jornada, mas nenhuma delas foi capaz de atingir o coração da JMJ-Rio 2013. Não obstante o clima de festa ocasionado pelo encontro, o que, de fato, marcou a alma dos jovens foi muito mais que a sensação simplista de uma viagem, mas o toque concreto com todos os artigos da fé que compõem o corpo da Igreja que é o próprio Corpo de Cristo.

A começar pela chegada dos peregrinos ao Rio de Janeiro, o Brasil e as demais partes do planeta puderam experimentar a universalidade da Igreja, desde os alegres cantos africanos à acolhida fraternal do povo carioca. Cada bandeira hasteada na praia de Copacabana revelava a dimensão da Noiva de Cristo que a acolhia e a vigiava de braços abertos de cima do Corcovado. Uma cena que deixou a Cidade Maravilhosa ainda mais... maravilhosa. Dos confins do mundo, aonde chegaram os profetas missionários de outrora, vieram as novas gerações de adoradores do Senhor, cuja única missão, concedida pelo Santo Padre, é ir novamente pelo mundo e anunciar o Evangelho a toda criatura.

O Rio de Janeiro que amargava tristes depredações e padecia sob um clima de guerra civil sem precedentes semanas atrás se convergiu num mar de pessoas que cantava louvores a Deus e pedia a intercessão da Mãe Aparecida. Imagem suficiente para arrancar lágrimas de policiais e sorrisos de bebês que, mesmo sem compreender concretamente o que lá acontecia, sabiam que era algo santo. O ódio dos protestos dos indignados foi afogado pela amor de Cristo. As profanações de meia-dúzia de coitados foram ofuscadas pela sacralidade de 3,5 milhões de batizados. De filhos do Altíssimo. De pessoas que, como pediu o Santo Padre na cerimônia de sua acolhida, botaram fé na verdade, no caminho e na vida que só se encontram em Jesus.



A Jornada Mundial da Juventude apresentou novamente às nações a pujança da Igreja e a sua capacidade de se renovar. Não, a Igreja não está morta. Pelo contrário, vive e se multiplica para além daqueles que profetizaram seu enterro e que, aliás, já estão enterrados. A história se repete e mais uma vez é a Igreja quem sai vitoriosa. Se em Madrid foram dias em que Deus parecia existir, como confessou o jornalista agnóstico Vargas Llosa, no Rio foram dias em que Ele confirmou sua existência. Diferente do que se viu dias atrás, dessa vez os jovens não saíram às ruas para depredar, mas para construir. E construir em cima da Rocha. E por isso gritavam: Esta é a juventude do Papa! Melhor, dos Papas. De Bento e de Francisco, pois a única ruptura proposta por eles é a ruptura com o pecado, não com a fé de dois mil anos como sugerem alguns teólogos mal intencionados por aí.

Os cantos que tomaram as ruas do Rio de Janeiro ainda encontrarão eco em muitos corações. Naquela praia, onde se celebrou a Missa de envio dos peregrinos, novamente exortou Jesus pela boca do Santo Padre: "Ide pelo mundo e fazei discípulos de todas as nações". E neste momento, em que muitos jovens ainda se encontram em ônibus ou aviões voltando para suas casas, também a cruz de Cristo vai com eles para indicar o caminho da Luz da Fé, a única capaz de conduzir o homem para a salvação eterna, onde as portas do inferno não prevalecerão.

Por: Equipe Christo Nihil Praeponere
http://www.padrepauloricardo.org/blog/a-jornada-mundial-da-juventude-que-a-midia-nao-mostrou

domingo, 21 de julho de 2013




JMJ - 2013 RIO DE JANEIRO

SANTUÁRIO NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS - ASSIS-SP






RUMO A JMJ ( JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE), RIO DE JANEIRO 2013!!!
GALERA QUE AMO, MEUS AMIGOS, TDO DE BOM!!!

ESSA SERÁ A MAIOR JORNADA DA MINHA VIA, ÍMPAR, PESSOAL E DE PESO 
ESPIRITUAL SEM MEDIDAS....

TRATADO DO DESÂNIMO - Parte I

Nota do blogue: Acompanhar esse especial AQUI.

TRATADO DO DESÂNIMO NAS VIAS DA PIEDADE

Obra póstuma do Padre J. Michel - 1952






O EFEITO MAIS FUNESTO DO DESÂNIMO É QUE A ALMA QUE

NELE CAI NÃO O CONSIDERA UMA TENTAÇÃO. A ESPERANÇA

E A CONFIANÇA EM DEUS É TÃO MANDADA QUANTO A FÉ E AS

OUTRAS VIRTUDES.

O que faz o grande mal de uma alma desanimada é que, iludida por um

temor excessivo que lhe disfarça os verdadeiros princípios, abatida pela

vista das dificuldades contra as quais não acha em si mesma recurso algum,

ela não considera esse estado como uma tentação. Se o encarasse sob

este ponto de vista, desconfiaria das razões que o alimentam: e, assim,

sairia dele bem mais cedo e mais facilmente.


Bem certo é, entretanto, que se trata de uma tentação bem definida;

porquanto todo sentimento que é oposto à lei de Deus, ou em si mesmo

ou pelas consequências que pode ter, evidentemente é uma tentação.

É assim que julgamos de todas as que podemos experimentar.

Se nos vem um pensamento contra a Fé, um sentimento contra a

Caridade, ou contra alguma outra virtude, consideramo-lo como

uma tentação, desviamo-nos dele, e aplicamo-nos a produzir

atos opostos a esse pensamento, a esse sentimento, que nos põe em 
perigo de ofender a Deus.

Ora, a Esperança e a confiança em Deus é tão mandada quanto a Fé

e as outras

virtudes. O sentimento que vai contra a Esperança é, pois, tão

proibido quanto

o que vai contra a Fé, e contra qualquer outra virtude: é, pois, uma

tentação bem caracterizada. A lei prescreve-nos fazer amiúde Atos

de Fé, de Esperança e de Caridade: proibe-nos, por isso mesmo,

todo ato, todo sentimento refletido contrário a essas virtudes tão

preciosas e tão salutares. Deve-se, pois, considerar o desânimo

como uma tentação, e mesmo como uma tentação das mais perigosas,

visto que expõe a alma cristã a abandonar toda obra de piedade.

Para tornardes sensível a vós mesmos esse perigo, examinai a conduta

ordinária dos homens. A esperança de ser bem su­cedido, de se proporcionar

um bem, de evitar um mal, numa palavra, de satisfa­zer algum desejo ou

alguma paixão, é que os faz agir, é que os sustenta nas penas que eles têm

de suportar, é que os ani­ma nos obstáculos que eles têm a vencer. Tirai-lhes

toda esperança, e logo eles cai­rão na inação. Só um homem no delírio pode

dar-se movimentos por um objeto que ele desespera de poder adquirir.

O mesmo efeito o desânimo produz na prática das virtudes; funda-se no

mesmo princípio, a falta dos meios para chegar ao fim que nos propomos.

A alma cristã que não espera vencer-se na prática de alguma virtude,

nada ou quase nada empreende para se fortificar. Os esforços

insuficientes que ela faz aumentam-lhe a fraqueza; e, mais do

que meio vencida pelo seu desânimo, ela se deixa facilmente

arrastar à paixão que a domina. A vista da sua fraqueza lança-a

primeiramente na irresolução, na perturbação. Neste estado, todo

ocupada da dificuldade que sente em combater, ela já não vê os

princípios que devem guiá-la. O temor de não ser bem sucedida

impede-a de enxergar os meios que deve adotar para vencer,

e que Deus lhe apresenta: ela se entrega, pois, ao inimigo sem

defesa. É como uma criança a quem a vista de um gigante que

avança contra ela faz tremer, e que não pensa em que uma pedra

basta para derrubá-lo, se ela se servir dessa pedra em nome do

Senhor. Essa alma, assim, desanimada, esquece-se de que tem

um socorro poderoso na bondade do Pai mais terno; e que é só

reclamar esse socorro, para sair vitoriosa do combate.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Da preparação para a santa Comunhão e da ação de graças.



Praeparate corda vestra Domino, et servite ei soli – “Preparai os vossos corações para o Senhor, e servi a Ele só” (I Reg. 7, 3).


Sumário. Três coisas são necessárias para a alma colher muito fruto da santa comunhão. Primeiro, o desapego das criaturas, banindo do coração tudo que não é de Deus ou para Deus. Segundo, o desejo de receber a Jesus Cristo com o único fim de mais o amar. Terceiro, a devida ação de graças depois da comunhão; imaginando que reside na alma como num trono de graças. Oh! Que tesouros de graças perde o cristão que pouco pensa em orar depois da comunhão!


I. Pergunta o cardeal Bona: “Onde vem que tantas almas, apesar das suas muitas comunhões, fazem tão pouco progresso no caminho de Deus?” e responde: “Defectus non in cibo est, sed in edentis dispositione – Não é falta de virtude em o nutrimento, é falta de preparação naquele que o recebe.” O fogo pega depressa na madeira seca e dificilmente na verde; porque esta não está disposta para arder. Os santos tiraram grandes frutos das suas comunhões porque punham muito cuidado em se preparar.


A preparação para a comunhão exige principalmente três coisas. A primeira é o desapego das criaturas, banindo do coração tudo que não é de Deus ou para Deus. Ainda que a alma esteja em estado de graça, mas com o coração cheio de apetites terrenos, quanto mais lugar ocupar a terra, tanto menos lugar restará para o amor divino. – Santa Gertrudes perguntou um dia ao Senhor, que preparação exigia que ela fizesse para comungar. E Jesus lhe respondeu: Só esta, que venhas receber-me bem vazia de ti mesma.


A segunda coisa necessária para comungar com grande fruto, é o desejo de receber a Jesus Cristo com o único intuito de mais o amar. Diz Gerson que neste banquete não são saciados senão os que têm grande fome. – Por isso, escreve São Francisco de Sales, que a principal intenção de uma alma que comunga deve ser progredir no amor de Deus. – “Importa”, diz o Santo, “receber por amor àquele que se nos dá só por amor.” Eis porque Jesus disse a Santa Mechtildes: “Quando fores comungar, deseja possuir todo o amor que jamais um coração teve para comigo e eu aceitarei teu amor como se fosse tal como o desejas.”


II. É necessária também a ação de graças depois da comunhão. A oração mais agradável a Deus é a que se faz depois da comunhão. A alma deve empregar este tempo em produzir algum sentimento piedoso ou oração. Os afetos devotos que a alma excita então têm mais merecimento diante de Deus, porque a presença de Jesus Cristo na alma que lhe está tão unida, exalta a dignidade dos atos. – Quanto às orações, Santa Teresa observa que depois da comunhão Jesus reside na alma como em um trono de graças e lhe diz: Quid vis ut faciam tibi – “Que queres que te faça?” Como se dissesse: Alma querida, vim de propósito do céu para te dispensar graças, pede-me o que quiseres e serás atendida.


Oh! Que tesouros de graças perdem os que pouco oram depois da comunhão!


Ó Deus de amor, Vós desejais tanto dispensar-nos as vossas graças e nós somos tão pouco solícitos em Vo-las pedir. Que remorso nos causará na hora da morte este descuido tão prejudicial! Meu Senhor, não Vos lembreis dos tempos passados; com vosso auxílio quero preparar-me melhor para o futuro, arrancando do meu coração o apego a todas as coisas que me impeçam de recebam todas as graças que Vós me quereis conceder. E depois da comunhão quero entreter-me convosco o mais possível, para obter de Vós o auxílio necessário ao progresso em vosso amor. Dai-me a graça de executar esta resolução.


Ó meu Jesus, quanto me descuidei no passado de vosso amor! O tempo de vida que pela vossa misericórdia ainda me dais é um tempo para me preparar para a morte e compensar pelo meu amor as ofensas que Vos fiz. Quero, pois, empregá-lo todo em chorar os meus pecados e em Vos amar. Amo-Vos, meu amor, amo-Vos, meu único Bem. † Jesus, meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas; mas tende piedade de mim e não me abandoneis. – Ó minha esperança, Maria, não deixeis nunca de me socorrer pela vossa intercessão. (II 407.)
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo Segundo: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 260-262.



terça-feira, 2 de julho de 2013

TRATADO DA CASTIDADE - 4ª Parte

TRATADO DA CASTIDADE
Bem-aventurados os puros
(SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO)

4ª Parte


§ IV. DA GUARDA DO CORAÇÃO



Santo Afonso
A modéstia dos olhos pouco nos servirá se não vigiarmos sobre o nosso coração. "Aplica-te com todo o cuidado possível à guarda do teu coração, diz o Sábio (Prov 4, 27), porque é dele que procede a vida". É aqui o lugar apropriado para se dizer algumas palavras sobre as amizades e, primeiramente, sobre as santas, depois sobre as puramente naturais e, afinal, sobre as perigosas.



1) Descrevendo São Paulo a corrupção moral dos gentios, enumerava entre seus vícios a falta de sentimento e de susceptibilidade para a amizade. A amizade, segundo São Tomás, é mesmo uma virtude. A perfeição não proíbe se entretenham amizades, diz São Francisco de Sales; exige somente que sejam santas e edificantes, a saber, só devem ser mantidas aquelas uniões espirituais por meio das quais duas, três ou mais pessoas, comunicam entre si seus exercícios de devoção, seus desejos piedosos e sentimentos nobres, tornando-se como que um só coração e uma só alma para a glória de Deus e o bem espiritual próprio e alheio. Com toda a razão podem tais almas exclamar: "Vede quão bom e suave é habitarem os irmãos em união" (Sl 132, 1). São Francisco diz mais que, em tal caso, o suave bálsamo da caridade destila de coração em coração por meio dessas mútuas comunicações, e bem pode-se dizer que Deus lança Sua benção sobre tais amizades, por toda a eternidade (Fil., III, c. 19).


Tais amizades são recomendadas pela Escritura mesma, em termos eloquentes: "Nada se pode comparar com o valor de um amigo fiel, e o valor do ouro e da prata não iguala a bondade de sua fidelidade" (Ecli 6, 16). "Um amigo fiel é um remédio para a vida e a mortalidade, e os que temem o Senhor encontram um tal" (Idem). Mas como podeis aconselhar as amizades particulares, dirá alguém, quando elas são tão rigorosamente condenadas por todos os ascetas? Respondo: As amizades particulares são proibidas unicamente nos claustros e com toda a razão, pois é imperiosamente necessário que todos os religiosos se amem mutuamente com amor fraterno, para que haja uma vida comum claustral. Ora, num claustro, as amizades particulares podem facilmente ocasionar perturbações dessa mútua caridade, dando ocasião a invejas, suspeitas e outras misérias humanas. São Basílio não hesitou dizer que as amizades particulares em um convento são uma sementeira perpétua de invejas, de desconfianças e inimizades. O mesmo acontece nas famílias em que o pai ou a mãe tem mais carinhos para um filho que para os outros. Os filhos de Jacó odiavam seu irmão José, porque seu pai lhe dedicava um amor especial.
Não há, além disso, nenhum motivo de se alimentar tais amizades num estado religioso, pois, num convento, onde reinam a disciplina e a ordem, todos os membros tendem ao mesmo fim, à perfeição, e não é necessário travar amizades particulares para animar-se mutuamente ao serviço de Deus e ao trabalho do aperfeiçoamento próprio.


Os que, vivendo no mundo, desejam dedicar-se à prática da virtude verdadeira e sólida, precisam, pelo contrário, de se unir aos outros por uma amizade santa e edificante, para poderem, por meio dela, se animar, se auxiliar e se estimular ao bem. Há no mundo poucas pessoas que tendem à perfeição e muitas que não possuem o espírito de Deus e, por isso, é preciso que os bons, quanto possível, evitem os que podem impedir seu adiantamento espiritual e travem amizade com os que os podem auxiliar na prática do bem.


2) Quanto às amizades puramente naturais, deve-se dizer que elas têm seu fundamento na nossa natureza, que nos compele a amar nossos pais, nossos benfeitores e todos aqueles em quem vemos belas qualidades e com quem simpatizamos. Esta espécie de amizade é o laço da família e da sociedade, mas facilmente degenera em amizades falsas; por exemplo, se os pais, por um carinho demasiado, toleram as faltas de seus filhos, ou se um amigo ofende a Deus para agradar a seu amigo, etc. As amizades naturais só são agradáveis a Deus se as santificarmos por meio da boa intenção; por exemplo, amando a nossos pais e amigos por amor de Deus.


3) Por amizades perigosas entendem-se, em particular, as sensuais, isto é, aquelas que se baseiam sobre uma complacência sensual, sobre a fruição comum de prazeres dos sentidos, sobre certas qualidades fúteis e vãs de espírito e coração. Essas amizades são já por si perigosas, mesmo que, no começo, nada tenham de inconveniente, e devemos guardar nosso coração desembaraçado delas.


a) "Quem não evita relações perigosas, cai facilmente no abismo", diz Santo Agostinho (Serm. 293). O triste exemplo de Salomão bastaria para nos encher de terror. Depois de ter sido amado tanto por Deus, servindo ao Espírito Santo de mão para escrever, travou relações com mulheres pagãs, já na sua velhice, e caiu tão profundamente que chegou a sacrificar aos deuses. Isso, porém, não nos deve estranhar, pois, será para admirar que alguém se queime, permanecendo no meio das chamas? - pergunta São Cipriano (De sing. cler.). Mas em nossas conversas, graças a Deus, não ocorre nada de mal, dirá alguém. Respondo: Todas as amizades que têm sua origem em afeições meramente materiais são, pelo menos, um grande impedimento à perfeição, ainda que não dessem ocasião a outras coisas. Elas, no mínimo, fazem-nos perder o espírito de oração e recolhimento interior; a alma que está presa por uma afeição natural poderá achar-se corporalmente na igreja, mas seu espírito estará se entretendo com o objeto de seu amor; perderá o amor aos Santos Sacramentos; não será mais sincera para com seu confessor, temendo que ele a obrigue a romper com essa cadeia e, envergonhando-se de lhe descobrir sua afeição, não lhe dirá a causa de sua tibieza, e assim se agrava, de dia para dia, seu estado lastimoso. Ao ouvir que fala mal da pessoa amada, se enfurece, defende-a calorosamente; descuida-se da obediência, pois quando o confessor a exorta a renunciar a tal amizade, procura mil desculpas para não ter de obedecer.


Não é só grande a perda espiritual que se sofre com essas amizades baseadas sobre certas qualidades externas duma pessoa, mas, principalmente se for doutro sexo, é também enorme o perigo que se corre de se se perder eternamente. No começo tais amizades parecem indiferentes, mas tornam-se pouco a pouco pecaminosas e, enfim, arrastam a alma ao pecado mortal. "São como o fogo e a palha, e o demônio não cessa de assoprar até irromper o incêndio", diz São Jerônimo.





Pessoas de diferentes sexos abrasam-se por causa da muita familiaridade, com a mesma facilidade com que a palha atingida pelo fogo, e, em certo sentido, até com mais facilidade, porque o demônio emprega tudo quanto é apto para atiçar o fogo. Santa Teresa viu-se um dia transportada ao inferno, onde Deus lhe mostrou o lugar que lhe preparara, se não rompesse com um apego puramente natural a um seu parente.


b) Se sentires em teu coração, alma cristã, uma tal afeição para com alguém, não há outro remédio para te libertares dela, senão cortá-la resolutamente de uma vez para sempre, pois, se quiseres renunciá-la pouco a pouco, crê-me, nunca chegarás a desfazer-te dela. Essas cadeias são dificílimas de romper, e só o conseguirá quem as quebrar violentamente, duma só vez. E não venhas com a desculpa de que, até agora, nada ocorreu de inconveniente, pois deves saber que o demônio não começa com o pior, mas só pouco a pouco leva a alma imprudente às bordas do precipício e, então, com um leve empurrão, precipita-as no abismo.


É uma máxima aceita por todos os mestres da vida espiritual de que, neste ponto, não há outro remédio senão fugir e afastar-se da ocasião. São Filipe Néri costumava dizer que, nesse combate, só os covardes saem vencedores, isto é, os que fogem da ocasião. Podemos resistir aos outros vícios ficando na ocasião, diz São Tomás (De mod. conf., c. 14), fazendo violência contra nós mesmos; mas o vício contrário à pureza, porém, só o poderemos vencer fugindo da ocasião e renunciando às afeições perigosas. Se sentires, porém, teu coração livre e desembaraçado de tais afeições, toma todo o cuidado possível para não te emaranhares em laço algum, como já se tem dado a muitos em razão de sua negligência. Eis o conselho que te dá São Jerônimo (Ep. Ad Eust.): "Se, no trato com alguém, notares que alguma afeição desregrada se quer apoderar de teu coração, apressa-te a sufocá-la antes que se torne um gigante. Enquanto o leão é ainda pequeno, pode ser facilmente trucidado; uma vez crescido, tornar-se-á mui difícil e humanamente impossível".


Coisa verdadeiramente lamentável e vergonhosa seria se permitisses que fizessem, em tua presença, gracejos indecentes. Não julgues que não pecas calando-te e simplesmente ouvindo tais gracejos; se não evitares o mais depressa possível a companhia de um homem tão insolente, já cooperaste com o seu pecado e te fizeste réu dele. Se receberes de alguém uma carta com palavras amorosas, rasga-a imediatamente ou lança-a ao fogo e não lhe dês resposta. Se, por motivo grave, tiveres de responder, faze-o então em poucas e sérias palavras, e não dês a entender que notaste as tais palavras e muito menos que achaste nelas qualquer prazer.


c) Não repliques também que não há perigo, porque a pessoa de que se trata é piedosa. São Tomás de Aquino diz (De mod. conf., c. 14): "Quanto mais santas são as pessoas pelas quais sentimos afeição particular, tanto mais devemos nos acautelar, porque o alto apreço que fazemos de sua virtude mais nos estimula ainda a amá-las". O padre Sertório Caputo, da Companhia de Jesus, diz: "O demônio, a princípio, nos inspira amor à virtude daquela pessoa, depois o amor à própria pessoa e, finalmente, nos lança na perdição". O Doutor Angélico faz notar que o demônio sabe perfeitamente esconder um tal perigo: no começo não dispara seta alguma que pareça envenenada, mas só tais que excitem a afeição, ocasionando leves feridas do coração; em seguida, quando o amor já está aceso, essas pessoas já não se tratam mais como anjos, mas como homens de carne e sangue: trocam repetidos olhares e palavras amorosas, desejam estar muitas vezes a sós, juntas e, por fim, a piedade espiritual degenera em amor carnal.


d) São Boaventura indica cinco sinais dos quais se pode deduzir se a afeição que a alguém nos prende é impura. Primeiro: se se entretêm conversas inúteis; e inúteis são todas as que levam muito tempo. Segundo: se ocorrem olhares e louvores mútuos. Terceiro: se se desculpam as faltas reciprocamente [evitando correções para não desagradar]. Quarto: se aparecem pequenos ciúmes. Quinto: se a separação causa certa inquietação. Eu ajunto ainda: Se se sente grande prazer e gosto nas maneiras ou gentileza natural da pessoa amada, se se deseja que a afeição seja correspondida, e se se não gosta de que outros observem, ouçam ou falem disso.


e) Mas, mesmo as pessoas que pretendem contrair matrimônio, estarão obrigadas a sufocar a inclinação ou simpatia recíproca, suposto mesmo que seja honesta? Perguntará-me alguém. Se esses futuros esposos estiverem animados de tais sentimentos, que estejam prontos a empregar todos os cuidados para tornar remota a ocasião próxima do pecado, e resolvidos a nunca ofender a Deus por causa de tal afeição, não precisarão romper com ela. A experiência, porem, ensina que os mais nobres sentimentos degeneram facilmente em paixão.


Por esse motivo os teólogos exigem muita cautela com essas pessoas. Sabendo o quanto o coração humano é inclinado ao pecado e quão fraco quando dominado por uma paixão, só permitem tais relacionamentos entre os jovens quando estão em idade e têm vontade séria de se casar; além disso, que não sejam travadas sem o consentimento dos pais, que não se prolonguem por muito tempo e só se namorem quando estiver próximo o casamento; também lhes interditam a conversa a sós, longe das vistas dos pais, grande familiaridade, e tudo o que possa manchar a pureza da alma, seja por pensamentos, olhares, palavras ou gestos. Do filho de Tobias podemos aprender como os jovens devem se preparar para o casamento. Na cidade de Ragés, na Média, vivia uma piedosa donzela, de nome Sara, filha de Raguel. Estava profundamente aflita porque sete rapazes, que a haviam sucessivamente desposado, haviam sido mortos pelo demônio da impureza, Asmodeu, na primeira noite depois das núpcias. Ora, o anjo Rafael, que acompanhara o jovem Tobias em sua viagem a Ragés, aconselhou-o a pedir Sara em casamento. Ele, porém, a par do ocorrido com os outros homens, temia expor-se ao mesmo perigo. O Anjo, porém, tranquilizou-o, dizendo: "Ouve-me... o demônio só tem poder sobre aqueles que abraçam o estado conjugal excluindo a Deus de seus pensamentos, para satisfazerem unicamente a sua concupiscência, como o cavalo e a mula, que não têm entendimento. Tu, porém, quando receberes a Sara, entra com ela no teu quarto por três dias e três noites, guardando continência, e não te entregues a outra coisa que à oração, e então a receberás em matrimônio no temor do Senhor, levado mais pelo desejo de ter filhos que pela concupiscência, para que sejas abençoado e teus filhos sirvam e glorifiquem a Deus; então nada terás a temer do demônio". O jovem Tobias seguiu esse conselho, e seu casamento foi muito abençoado por Deus.


Notemos igualmente as quatro exortações dadas a Sara por seus pais, ao se despedirem dela: Primeiro, honra a teu sogro; segundo, ama a teu marido; terceiro, cuida em governar bem tua casa; quarto, porta-te em tudo irrepreensivelmente. Estes avisos devem servir de norma a todos os jovens que pretendem contrair matrimônio. f) O que dissemos até aqui se refere ao trato com pessoas de diferente sexo. O amor desregrado, todavia, pode existir também existir entre pessoas do mesmo sexo, principalmente se são ainda moços e existe entre eles uma familiaridade por demais íntima. A este respeito, São Basílio diz o seguinte (Serm. de abd. rev.): "Vós que sois ainda jovens, evitai a companhia de vossos iguais, pois, por meio dessas amizades, o demônio já arrastou a muitos para o inferno". "Alguns começaram com uma afeição aparentemente santa, continua ele, mas pouco a pouco precipitou-os o demônio num lodaçal de vícios os mais abomináveis". Santa Ângela de Foligno se exprime de modo semelhante (Vit., c. 64): "Ainda que seja o amor a fonte de todo o bem, não deixa de ser igualmente a fonte de todo o mal. Não falo do amor impuro, que deve ser evitado em todo o caso, mas da inclinação, em si inocente, que facilmente pode degenerar em amor desordenado. O trato mui assíduo com outro, com protestos de afeição, tem por consequência tornar nocivo o amor, visto que ele prende estreitamente um coração ao outro, obscurecendo a afeição crescente cada vez mais a razão. Em pouco tempo só quererá um o que o outro quer, e então não terá mais coragem de resistir ao outro quando for convidado ao mal, e, assim, se perderão ambos".


Por isso, os que dedicam à educação da mocidade estão gravemente obrigados a ter os olhos abertos nesse ponto, e não precisam ter escrúpulos, suspeitando mal com algum motivo. Se notarem qualquer apego ou familiaridade entre dois jovens, intervenham imediatamente e conservem-nos rigorosamente separados um do outro. g) Aqui na terra cada um de nós anda por caminhos escabrosos e em trevas, e se, além disso, ainda um anjo mau, isto é, um mau companheiro, que é pior que um demônio, nos persegue e impele à perdição, como poderemos escapar ilesos? Já Platão dizia: "Tomarás os mesmos modos daqueles com quem convives". Segundo São João Crisóstomo, para se certificar dos hábitos de alguém, basta saber com quem ele anda, já que os amigos ou são ou fazem-se semelhantes uns aos outros. E isso por duas causas: primeiro, porque um se esforça por imitar o outro para lhe ser agradável; segundo, porque o homem, como nota Sêneca, é inclinado a fazer o que vê os outros fazerem. Dos israelitas lemos: "Eles se mesclaram com os gentios e aprenderam suas obras" (Sl 105, 35). Devemos, portanto, não só fugir do comércio com os impuros, diz o Sábio, mas também nos conservarmos longe de seus caminhos: "Meu filho, não andes com eles e não ponhas o pé em seus caminhos" (Prov 1, 15). Devemos evitar todo o trato com eles, suas conversas ou presentes, com os quais procuram nos enredar. "Meu filho, se os pecadores te atraírem com seus afagos, não condescendas com eles" (Prov 1, 10).


"Cairá, talvez, uma ave, no laço armado na terra, sem a isca?" (Am 3, 5). O demônio serve-se dos maus amigos como de iscas, segundo Jeremias, para prender as almas em suas redes de pecado. "Meus inimigos, sem motivo, prenderam-me como se prende uma ave" (Jer 3, 52). Ele diz 'sem motivo' porque, pergunto-se a um tal sedutor por que aliciou sua pobre vítima ao pecado, responderá: não havia motivo; eu só queria que ela fizesse como eu. É exatamente essa a astúcia do demônio, diz Santo Efrém: "Capturada uma alma em sua rede, serve-se dela como de uma armadilha para prender a outra" (De rect. viv. rat., c. 22).


Fujamos, pois, a toda familiaridade com tais escorpiões infernais, como se foge da peste. Digo: fujamos à familiaridade, isto é, não travemos amizade com homens viciosos, evitando tomar parte em sua mesa, banquetes ou outros convívios com eles. É impossível evitar todo o comércio com eles, porque então teríamos de sair deste mundo, segundo o Apóstolo (I Cor 5, 10); contudo, é bem possível evitar um trato mais familiar com eles, seguindo o conselho do mesmo Apóstolo: "Eu vos escrevi que não tenhais comunicação com eles... com um tal não deveis nem sequer cear". Disse ainda: Fujamos de tais escorpiões, pois o profeta Ezequiel designa assim os sedutores: "Pervertedores estão contigo e habitas com escorpiões" (Ez 2, 6).





Não ousarias, alma cristã, habitar com escorpiões, e certamente te afastarias com toda a pressa de sua proximidade. Pois assim deves evitar os amigos que dão escândalo e envenenam a tua alma com maus exemplos e conversas perversas. Quanto mais estreitamente estão ligados a nós, tanto mais perniciosos se tornam. "Os inimigos do homem são os seus domésticos" (Mat 10, 36). Na Sagrada Escritura se diz: "Quem se compadecerá de um encantador mordido pela serpente e de todos os que se aproximam de animais ferozes? Assim também, quem se compadecerá daquele que se torna companheiro de um homem iníquo?" (Ecli 12, 13). Se um tal homem, por motivo do perigo a que se expõe, cai no pecado e se precipita na condenação eterna, ninguém, nem Deus nem os homens, terá compaixão dele, pois já fôra advertido do perigo.

Tratado da Castidade - 5ª Parte



TRATADO DA CASTIDADE
Bem-aventurados os puros
(SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO)
5ª Parte
§ V. DA VIRGINDADE


Santo Afonso

São Cipriano (De disc. et hab. virg.) denomina a multidão de virgens que se consagram ao amor de seu Divino Esposo, de "a mais nobre porção da Igreja de Cristo". Vários outros Santos Padres, como Santo Efrém, Santo Ambrósio, Santo Agostinho, São Jerônimo, São Crisóstomo, escreveram livros inteiros em louvor da virgindade. Não é minha intenção expor aqui todos os méritos e vantagens que adquirem as pessoas que consagraram a Deus sua virgindade; disso tratarei extensamente no capítulo IV da III parte, que trata do voto de castidade [que reproduzimos logo abaixo]. Aqui farei seguir, simplesmente, uma instrução para os que levam uma vida virginal sem terem emitido o voto de castidade.


As almas virgens são extraordinariamente belas aos olhos de Deus: "Serão como os Anjos de Deus no Céu" (Mat 22, 30). Barônio conta que na morte de uma virgem, chamada Geórgia, uma multidão de pombos adejavam ao redor da casa e, quando seu cadáver foi transportado à igreja, pousaram no teto, exatamente em cima do lugar onde se achava o caixão, e daí não se retiraram até ser sepultada a piedosa virgem (An. 480). Essas pombas certamente eram Anjos, que queriam prestar as últimas honras àquele corpo virginal.
As almas virginais, que renunciaram ao casamento para se dedicarem exclusivamente ao amor de Jesus Cristo, tornam-se esposas do Filho de Deus. Nos Santos Evangelhos, Jesus Cristo é chamado Pai, Mestre, Pastor das almas; referindo-se as virgens, porém, dá-Lhe o nome de Esposo: "Elas saíram a receber o Esposo e a Esposa" (Mat 25, 1). Por isso, tinha razão Santa Inês, respondendo, segundo Santo Ambrósio, aos que lhe ofereciam a mão do filho do prefeito de Roma: "Ofereceis-me um esposo? Já encontrei um muito melhor" (De virg., 1. 1). Semelhante resposta deu Santa Domitila, sobrinha do imperador Domiciano, aos que queriam persuadi-la a casar-se com Aureliano: "Dizei-me: a quem deveria escolher por esposo uma jovem pedida em casamento por um monarca e por um camponês? Para casar-me com Aureliano, teria de renunciar ao Rei do Céu. Ora, isso seria uma loucura inominável, que nunca praticarei". E, firme nessa resolução, deixou-se queimar viva, para poder permanecer fiel a Jesus Cristo, a Quem consagrara sua virgindade.
Quem poderá imaginar a glória que Deus reserva a Suas castas esposas lá no Céu? Os teólogos são de opinião que no Céu existe uma glória especial reservada às virgens, uma coroa ou alegria particular, de que estão privados os outros Santos. Mas, dir-me-á uma ou outra jovem: 'Ora, casando-me também poderei santificar-me'. Não receberás a resposta da minha boca, mas da de São Paulo, que te dirá também a diferença que existe entre as virgens e as casadas: "A mulher virgem pensa nas coisas que são do Senhor, para que seja santa no corpo e no espírito. Mas, a que é casada, pensa nas coisas que são do mundo, em como agradar ao marido. Em verdade, digo isso para vosso proveito... para vos exortar ao que vos convém e vos facilita a orar ao Senhor sem embaraço" (I Cor 7, 34).


Deve-se, pois, notar que as casadas, sem dúvida alguma, podem ser santas segundo o espírito, ao passo que as virgens, que amam a Deus, o são de corpo e espírito. Tome-se também em consideração estas palavras: "O que facilita servir a Deus sem impedimento". Quantos impedimentos não encontram as casadas na sua tendência à santidade! E esses obstáculos são tanto maiores, quanto mais elevada a sua condição [social].
Para nos fazermos santos temos de empregar os meios e, antes de tudo, nos consagrar à oração mental, receber amiúde os Santos Sacramentos, e pensar sem interrupção em Deus. Ora, quando uma senhora casada achará tempo para cuidar naquilo que é do Senhor? Ela se ocupará com as coisas deste mundo, diz São Paulo, cuidará em agradar a seu marido, olhará pelas necessidades de sua família, pelo seu sustento e vestes, vigiará a educação de seus filhos, atenderá aos parentes e amigos, pensará continuamente nos seus afazeres; seu coração ficará assim dividido entre seus filhos, seu marido e Deus. Como encontrar tempo para se entregar a longas orações mentais, para receber muitas vezes a Comunhão, se nem lhe resta tempo para cuidar de todas as obrigações de sua casa e estado? O marido quer ser atendido, os filhos gritam e choram, querendo mil coisas diversas. Como meditar entre tantos cuidados e perturbações? Muitas mães de família nem mesmo aos domingos podem ir à igreja. É verdade, ela pode conservar a sua boa vontade, mas sempre lhe será custoso cuidar, como convém, do que é do Senhor. Não há dúvida de que pode adquirir grandes merecimentos em razão de tais provações, entregando-se à Vontade de Deus que, em tais condições, não que mais do que um sacrifício perene de resignação e paciência; mas, no meio de tantas distrações e tribulações, é quase impossível, é mesmo heroísmo, praticar a virtude da paciência e conformidade, sem o exercício da oração e a recepção dos Sacramentos... Mas, prouvera a Deus que as senhoras casadas nada mais tivessem a deplorar que a falta de tempo necessário para seus exercícios de piedade.


A má conduta do marido, os desgostos causados pelos filhos, os negócios da casa, as molestas atenções que se devem à sogra e aos cunhados, as suspeitas, as inquietações de consciência quanto à vida conjugal e educação dos filhos, tudo isso origina um mar de tribulações, no qual passam sua vida entre suspiros e lágrimas. E felizes se conseguirem salvar sua alma e alcançarem de Deus a graça de não deixarem o inferno desta vida para se precipitarem no inferno eterno! Esta é a bela sorte das jovens que se consagram ao mundo... [grifo do original]


Mas, entre tantas mulheres casadas, não haverá uma só que se santifique? Sim, existem também Santas casadas. Porém, quais são estas? As que se santificam pelo martírio, que sofrem tudo por amor de Deus, com uma paciência que nada abala. Mas, quantas se elevarão a tal perfeição? Ah! Mui poucas. E se encontrares uma tal, verás que deplora amargamente ter escolhido o partido do mundo, tendo podido, com tanta facilidade, consagrar-se a Jesus Cristo.


Verdadeiramente felizes são aquelas virgens que se consagram por inteiro e exclusivamente ao seu Divino Salvador. Estas estão livres dos perigos em que se acham as casadas. Seu coração está desembaraçado do apego aos filhos e marido, aos bens transitórios, ao luxo vão ou a outras coisas do mundo.


E, quando as mulheres casadas se vêem obrigadas a empregar muitos cuidados e grandes somas com seu traje, para aparecer ao mundo à altura de sua posição e agradar a seu marido, a virgem que se consagrou a Jesus Cristo se contenta com um vestido simples e desataviado, pois, do contrário, daria escândalo. Todos os seus pensamentos e cuidados tendem a agradar a Jesus, a quem dedicou seu corpo, sua alma, seu amor todo. Assim, possui ela também mais liberdade de espírito para pensar em Deus e mais tempo para se entregar à oração e receber os Sacramentos.
Se não te sentes chamada, alma cristã, ao estado conjugal, nem ao religioso, mas desejas fazer-te santa no mundo, como verdadeira esposa de Jesus Cristo, toma a peito os seguintes conselhos: Para a santificação, não é suficiente que uma virgem traga ilibada a sua pureza e use o nome de esposa de Jesus Cristo; é preciso também praticar as virtudes de uma esposa de Jesus. No Evangelho é o reino dos Céus comparado a umas virgens. Mas que virgens? Às virgens prudentes e não às loucas. Aquelas foram introduzidas na sala das núpcias; a estas foi a porta fechada e ouviram do Esposo: Não deixais de ser virgens, mas eu não vos reconheço por esposas minhas. As verdadeiras esposas de Jesus seguem o Esposo para onde quer que Ele vá (Apoc 14, 4). que quer dizer seguir o Esposo? Santo Agostinho explica que é prender-se a Ele (De s. virg., c. 7). Depois de Lhe teres sacrificado teu corpo, deves ainda consagrar-Lhe todo o teu coração, de tal forma que só te ocupes em amá-lO. Para isso, deves empregar os meios para pertencer exclusivamente a Ele.



O primeiro é a oração mental, a que te deves dedicar com todo o zelo. Não julgues que, para isso, é necessário se recolher a um convento ou passar todo o dia na igreja. Não há dúvida que em uma casa de família há barulho e perturbações de pessoas que entram e saem; mas quem tem boa vontade encontra sempre jeito e tempo para fazer suas orações; por exemplo, de manhã, antes de se levantarem as pessoas da casa, ou de noite, depois de já se terem recolhido. Também não se requer que se esteja sempre de joelhos; podem-se recitar as orações durante o trabalho ou caminhando; basta elevar o pensamento a Deus, pensar na Paixão de Cristo ou meditar sobre qualquer outro assunto devoto.


O segundo meio é a recepção assídua dos santos sacramentos da Penitência e Eucaristia. (...) Quanto à Comunhão, não é muita coisa se for recebida só por obediência; deve-se ter desejo Dela, e pedi-lA. Esse Divino Pão quer ser desejado e que se tenha fome Dele. A Comunhão é que faz com que as esposas de Jesus permaneçam fiéis a seu Divino Esposo, já que a Ela devem em especial a conservação de sua pureza. Este Divino Sacramento conserva na alma toda espécie de virtudes, sendo, porém, seu efeito principal, conservar ilibado o lírio da virgindade, dando-Lhe o profeta, por isso, o nome de "nutrimento dos escolhidos e vinho que gera virgens" (Zac 9, 17).


O terceiro meio é o recolhimento e a vigilância. O Divino Esposo compara Sua esposa com um lírio entre os espinhos (Cânt 2, 2). Uma donzela que quer viver na sociedade, entre divertimentos e distrações mundanas, não poderá permanecer fiel a Jesus Cristo. Deve, pelo contrário, estar sempre circundada dos espinhos da abstinência e mortificações, e guardar, em especial no trato com homens, a maior reserva, e rigorosa modéstia dos olhos e palavras e, mesmo, se necessário, mostrar-se austera e descortês.


Os espinhos são o que protegem os lírios, isto é, as virgens; sem eles, perder-se-ão em pouco tempo. O Senhor compara a beleza de Sua esposa com a da pomba (Cânt 1, 9). Por quê? Porque a pomba, por instinto natural, evita a companhia dos outros pássaros. Assim, uma virgem é bela aos olhos de Jesus, se leva uma vida retirada e se se esconde, quanto possível, aos olhos do mundo. São Jerônimo diz (Ep. ad Eust.) que o Esposo das almas é cioso. Desgosta-se muito, por isso, de uma virgem que, depois de se haver consagrado ao Seu amor, gosta de mostrar-se e procura agradar aos homens.


Pessoas verdadeiramente virtuosas preferem desfigurar-se a si mesmas a tornar-se objeto de amor criminoso. Se, por desgraça, acontecer tornar-se uma virgem vítima de uma violência qualquer, sem culpa sua, não deve inquietar-se com isso, já que sua pureza não fica alterada. Foi o que Santa Lúcia respondeu ao tirano que a ameaçava de entregá-la ao prostíbulo: "Se eu for desonrada contra minha vontade, receberei uma coroa dupla". Com razão se diz: Não o sentimento, mas o consentimento fere a alma.


Além disso, podemos ficar convencidos que uma virgem modesta e reservada saberá também fazer-se respeitar.


O quarto meio é a mortificação dos sentidos. Uma virgem que quer conserva-se pura, diz São Basílio, deve ser pura na língua, falando sempre com decoro e, se for necessário tratar com homens, só dizer o indispensável; pura nos ouvidos, evitando ouvir conversas mundanas; pura nos olhos, conservando-os fechados ou, ao menos, baixos, quando na companhia de homens; pura no tato, usando do máximo cuidado quanto aos outros e quanto a si mesma; pura principalmente no espírito, esforçando-se por resistir aos maus pensamentos, recorrendo a Jesus e Maria.


Para conseguir isso, é preciso que ela mortifique seu corpo com jejuns e outras penitências. Jesus Cristo é um 'Esposo de Sangue' (Ex 4, 26), que desposou nossa alma na ara da Cruz e, por amor dela, derramou até a última gota de Sangue. Por esse motivo, Suas esposas suportam angústias, doenças, dores, maus tratos e injúrias, não só com paciência, mas até com alegria. Assim deve-se entender o texto da Escritura, que diz: "As Virgens seguem o Cordeiro para onde quer que Ele vá" (Apoc 14, 4). Elas seguem jubilosas e cantando a Jesus, seu Divino Esposo, mesmo no meio dos opróbrios e penas, a exemplo de milhares de virgens que foram ao encontro da morte e das torturas, cheias de alegria.


Finalmente, deves recomendar-te instantemente a Maria, a Rainha das Virgens, se quiseres perseverar no teu estado de virgindade perpétua. Ela é que prepara e conclui a união das almas com Seu Divino Filho; Ela que alcança para essas almas escolhidas a graça da perseverança, pois, sem a Sua assistência, todas tornar-se-iam infiéis.
Vós, que ledes estas linhas, - dirijo-me àquelas que se sentem chamadas pelo Divino Esposo a renunciar ao Matrimônio - vós, que quereis pertencer a Jesus Cristo, não vos obrigueis desde logo por um voto, nem façais, logo no começo, o voto de castidade perpétua; fazei esse voto quando Deus vo-lo inspirar e o confessor o permitir.
Aconselho-vos, porém, que agradeçais a Jesus Cristo, vos ter chamado a Seu especial amor, e vos ofereçais ao Senhor como coisa que Lhe é consagrada e própria para todo o sempre. E, por isso, dizei-Lhe assim: Ó meu Jesus, meu Deus e Salvador, que por mim morrestes, perdoai-me se também eu ouso chamar-vos meu Esposo. Ouso porque vejo que Vos agrada chamar-me a essa honra. Essa graça é tão grande, que não Vo-la posso agradecer suficientemente. Eu merecia estar agora ardendo no inferno, porém, em vez de me castigar, escolheis-me para esposa Vossa. Pois bem, meu Divino Salvador, eu renuncio ao mundo, eu renuncio a tudo por amor de Vós e a Vós me entrego inteira e irrevogavelmente. De hoje em diante sereis meu único bem, meu único amor. Vejo que quereis possuir meu coração inteiro: ei-lo, entrego-o sem restrição. Aceitai meu sacrifício e não me repulseis como eu mereceria. Esquecei-Vos de todas as ofensas que Vos tenho feito até hoje: detesto-as de todo o coração. Ah! Tivesse eu morrido antes de Vos haver ofendido! Perdoai-me em Vosso amor, e concedei-me a graça de Vos permanecer fiel e nunca mais Vos abandonar. Vós, ó meu Esposo, Vos entregastes todo a mim; eis-me aqui, eu também quero entregar-me toda a Vós. Ó Maria, minha Rainha e minha Mãe, prendei meu coração ao Coração de Jesus Cristo; ligai-me tão fortemente a Ele, que nunca mais possa desprender-me de Vosso Divino Filho.

Tratado da Castidade - 6ª Parte - Fim TRATADO DA CASTIDADE Bem-aventurados os puros (SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO)


Tratado da Castidade - 6ª Parte - Fim

TRATADO DA CASTIDADE
Bem-aventurados os puros
(SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO)

6ª Parte
§ VI. DO VOTO DE CASTIDADE

I. Uma alma que consagra a Deus a sua virgindade torna-se uma esposa de Jesus Cristo, e por isso o Apóstolo não hesita em escrever (II Cor 11, 2): "Eu vos desposei com um Esposo, com Cristo, para vos apresentar a Ele como virgem pura". Jesus Cristo mesmo se dá como Esposo das virgens, na parábola das dez virgens: "Saíram ao encontro do Esposo... e entraram com Ele para as núpcias" (Mat 25, 10). O Divino Salvador deixa-se chamar pelos outros fiéis de Mestre, Pastor e Pai; quer, porém, ser chamado de Esposo pelas almas virgens. Esses desponsais com o Senhor, se realizam por meio da fé: "Eu me desposarei contigo pela fé" (Os 2, 20). A virtude da virgindade é um fruto especialíssimo dos merecimentos de Jesus Cristo, e por isso se diz, no Apocalipse (14, 4), que as virgens formam o cortejo do Cordeiro. A Santíssima Virgem revelou a uma alma devota que uma esposa de Jesus Cristo deve, acima de todas as virtudes, amar a pureza, porque ela a torna de modo especial semelhante a seu Divino Esposo. São Bernardo diz que todas as almas justas são esposas do Senhor, "mas de um modo particular vale isso das almas virgens", como nota Santo Antônio de Pádua. Por isso São Fulgêncio chama a Jesus Cristo o Esposo de todas as virgens consagradas a Deus.
Uma moça que quer permanecer no mundo e casar-se, se é prudente, se informa com todo o cuidado a respeito dos que solicitam a sua mão, para conhecer o mais digno e o mais capaz de torná-la feliz aqui na terra. A pessoa religiosa, por sua vez, desposa-se, pelos votos, com Nosso Senhor Jesus Cristo. Procuremos a esposa dos Cânticos, que sabe perfeitamente avaliar as qualidades desse Esposo Divino, e perguntemos-lhe: 'Quem é o vosso amado, ó santa esposa? Quem é aquele que possui todo o vosso coração e vos tornou a mais feliz das mulheres?' Ela responde: 'Meu Amado é branco e vermelho: é branco por Sua pureza, e vermelho pela chama do amor em que se abrasa por Sua esposa; em uma palavra, Ele é tão belo, tão perfeito em todas as virtudes, que não há nem pode haver um outro esposo mais nobre ou mais amoroso que Ele'. "Nem quem O iguale em Sua grandeza, nem em Sua beleza, nem em Sua generosidade", diz Santo Euquério. Por isso escreve Santo Inácio de Antioquia: "Aquelas bem-aventuradas virgens, que se consagraram a Jesus Cristo, podem estar certas de que não encontrarão, nem no céu nem na terra, um esposo tão belo, tão nobre, tão rico, tão amável como Aquele que lhes foi dado, Jesus Cristo".


Santa Clara de Montefalco dizia que prezava tanto sua virgindade, que antes quereria sofrer durante toda a sua vida as penas do inferno, do que perder esse valioso tesouro. Com toda a razão, pois, muitas virgens virtuosas renunciaram a casamentos principescos para permanecerem esposas de Jesus Cristo. Santa Joana, infanta de Portugal, renunciou à mão de Luís XI, rei da França; a Beata Inês de Praga, à do imperador Frederico II; Isabel, filha do rei da Hungria e herdeira do reino, à de Henrique, arquiduque da Áustria, e muitas outras procederam do mesmo modo.


Uma virgem que se consagra ao Senhor, diz Teodoreto, está livre de todo o cuidado inútil. Não tem outra coisa a fazer senão entreter-se contínua e familiarmente com Deus. Isso indica o Apóstolo quando diz que a virgem "é santa no corpo e na alma" (I Cor 7, 34); santa no corpo pela castidade, santa no espírito por seu comércio íntimo com Deus. "Se ela não tivesse outra recompensa a esperar, diz Santo Anselmo, só por estar livre dos cuidados seculares e não ter outra obrigação, já deveria ser tida por sumamente feliz". Do que se vê que as virgens não só receberão uma imensa glória no Céu, mas já serão recompensadas antecipadamente aqui na terra, com uma paz inalterável. As virgens que se consagram ao amor de Jesus Cristo, ofertando-Lhe o lírio da pureza do coração, tornam-se tão agradáveis a Deus como os Santos Anjos, - certamente um efeito sublime da castidade virginal. Todas as virgens que buscam a perfeição são esposas queridas de Jesus Cristo, porque Lhe consagraram seu corpo e sua alma, e nada mais buscam nesta vida que agradar-Lhe. São João foi o discípulo amado de Jesus, porque guardou a virgindade. Justamente por esse motivo amava-o Jesus mais que aos outros discípulos, como a Igreja o insinua quando diz: "Foi escolhido como virgem pelo Senhor, e mais amado que todos os outros".


As virgens são chamadas, na Sagrada Escritura, as primícias de Deus: "São virgens; esses seguem o Cordeiro aonde quer que Ele vá. Esses foram comprados dentre os homens, para serem as primícias para Deus e para o Cordeiro" (Apoc 14, 4). Mas por que são chamados primícias de Deus? O Cardeal Hugo responde: "Como os primeiros frutos são mais agradáveis que os outros, assim também as virgens consagradas a Deus agradam mais ao Coração deste e constituem o objeto de seu especial amor".


Diz-se ainda, na Sagrada Escritura, que o Esposo Divino "se apascenta entre os lírios" (Cânt 2, 16). Esses lírios representam as virgens que conservam sua pureza por amor de Deus. Um expositor nota o seguinte nessa passagem dos Cânticos: "Enquanto o demônio procura a imundície da impureza, Jesus Cristo se apascenta [isto é, descansa,] entre os lírios da castidade".


O que, porém, deve aumentar consideravelmente a nossos olhos o valor da virgindade, é o louvor extraordinário que lhe tece o Espírito Santo, dizendo: "Tudo o que se aprecia não é comparável a uma alma continente" (Ecli 26, 20). Isso mesmo nos deu a entender a Santíssima Virgem, quando disse ao Arcanjo que Lhe anunciava a divina maternidade: "Como se dará isso, se não conheço varão?" (Lc 1, 14). Maria, com essas palavras, mostrou que preferiria renunciar à dignidade de Mãe de Deus, a perder o tesouro de Sua virgindade.


Segundo São Cipriano, a pureza virginal é a rainha de todas as virtudes e o complemento de todos os bens. Santo Efrém escreve que as virgens que guardam a sua pureza por amor de Jesus Cristo, serão favorecidas por Ele em todos os pontos. São Bernardo acrescenta que a virgindade habilita a alma, de um modo todo especial, a ver o Divino Esposo nesta vida pela fé, e na outra pela luz da glória. Imensa é a glória que Jesus Cristo prepara no Céu às Suas esposas que na terra Lhe consagraram sua virgindade. Nosso Senhor mostrou um dia à Sua grande serva Lucrécia Orsini os sublimes tronos que ocuparão aqueles que serviram a Jesus Cristo em pureza virginal. Ao que exclamou ela: "Oh! Quão agradáveis não são a Jesus e a Maria as virgens!" Os teólogos afirmam que as virgens receberão no Céu uma auréola especial, sendo ornadas com uma luzente coroa de honra e glória, pois se diz na Sagrada Escritura, a respeito das virgens: "Ninguém podia cantar esse cântico, senão aqueles cento e quarenta e quatro mil que foram comprados na terra". Explicando essa passagem, diz Santo Agostinho que a glória que Jesus Cristo concede às Virgens não confere aos outros Santos.
II. Grande é a satisfação de Jesus Cristo quando alguém se associa ao número de Suas esposas. Isso declaram aquelas palavras dos Cânticos: "Vinde, ó filhas de Sião, e vede o rei Salomão com o diadema com o qual o coroou sua mãe no dia de suas núpcias, no dia da alegria de seu coração" (Cânt 3, 11). Isso, porém, vale só daquelas almas que se consagraram sem restrição ao amor do Esposo Divino. Desposando Jesus uma tal alma, quer que todo o Céu se alegre com Ele e entoe hinos de regozijo: "Alegremo-nos e exultemos e demos-Lhe glória, porque são chegadas as bodas do Cordeiro e Sua esposa está ornada" (Apoc 19, 7). Os ornatos com que Jesus quer ver ataviadas Suas esposas são as virtudes, particularmente o amor e a pureza, que são apresentadas nos Cânticos como coroas de prata e de ouro: "Nós te faremos umas cadeias de ouro listradas de prata" (Cant 1, 10). São estas as vestes pomposas e as joias com que o Senhor atavia Suas esposas, e das quais fala Santa Inês: "Ele circundou minha direita e meu pescoço com um colar de pedras preciosas, revestiu-me com um hábito bordado a ouro e ornado com artísticos relevos e deslumbrantes adornos".


Os seculares buscam coisas terrenas, mas as esposas de Jesus Cristo nada mais querem senão Deus; por isso delas se pode afirmar ao pé da letra: "Esta é a geração dos que buscam a Deus" (Sl 23, 6). "Ó esposas do Redentor, exclama São Tomás de Villanova, não deveis buscar qual de vós sobrepuja as outras por seu nascimento, seus talentos ou fortuna; examinai, antes, quem é mais agradável ao Esposo Divino, quem vive unida mais intimamente a Ele, quem é mais humilde, pobre e obediente". Ouçamos também o que diz o Espírito Santo: "Filho, quando entrares ao serviço de Deus... prepara tua alma para a tentação" (Ecli 2, 1), para sofreres com humildade e paciência, pois "o ouro e a prata se provam no fogo, e os homens que Deus quer receber, na fornalha da humilhação" (Id. v. 5). "Ninguém pode servir a dois senhores" (Mat 6, 24), a Deus e ao mundo. quem, portanto, quiser consagrar-se a Deus deve renunciar ao mundo, e quem quiser tornar-se esposa de Jesus Cristo deverá exclamar incessantemente: "Deus só é todo o meu tesouro e meu único bem".


São José de Calazans diz que, se não se der a Jesus todo o coração, não se Lhe deu nada. Isso é inteiramente verdade, porque nosso coração já é em si muito pequeno para amar dignamente a um Deus que merece um amor infinito; e esse pequeno coração deveria ainda ser dividido entre Deus e as criaturas?


Como poderás, pois, tu, alma cristã, te incomodares com o mundo, depois de te consagrares a Deus? Esquece de tudo o mais e procura guardar o teu coração inteiro para teu Divino Esposo, que escolheste para Lhe dedicares todo o teu amor. Eu disse: teu coração inteiro, porque Jesus Cristo quer que Sua esposa seja "um jardim fechado e uma fonte selada" (Cânt 4, 12); um jardim fechado, pois não deve receber a ninguém mais senão a seu Divino Esposo; uma fonte selada, porque esse Divino Esposo é zeloso e não permite que encontre entrada no coração de sua esposa outro amor que o amor por Ele. Por isso diz-Lhe: "Quero que me coloques como um selo sobre teu coração e sobre teu braço" (Cant 8, 6), para que a ninguém mais ames senão a Mim, e para que todos os teus atos sejam feitos com a única intenção de Me agradares. O Amado é colocado como um selo sobre o coração e o braço, diz São Gregório, quando a alma mostra por sua vontade (isto é, o coração) e por suas ações (isto é, o braço), quanto ama a seu celeste Esposo.
Quando o amor divino reina numa alma, expulsa toda a afeição que não se refere a Deus, pois "o amor é forte como a morte" (Id. it.). Como nada há que possa resistir à veemência da morte quando é chegada a sua hora, assim também não há nenhum impedimento e nenhuma dificuldade que não seja superada pelo amor divino, quando ele se apodera de um coração. "Se um homem der todas as riquezas de sua casa, ele as desprezará como se nada tivesse dado" (Id., v. 7). Um coração que ama a Deus, despreza tudo o que lhe oferece e pode oferecer o mundo; numa palavra, ele despreza tudo o que não é Deus. São Bernardo diz que Deus, como nosso Senhor, exige de nós temor; como Pai, respeito; como Esposo, porém, unicamente amor.


A Venerável Francisca Farnese não conhecia meio mais eficaz para estimular a si e às suas companheiras a tender à perfeição, do que a recordação de que eram esposas de Jesus Cristo. Está fora de dúvida, dizia ela, que cada uma de vós foi escolhida por Deus para se tornar santa, pois que vos concedeu agrande honra de vos fazer Suas esposas. E, de fato, é essa uma graça inapreciável, que exige uma fiel cooperação. Santo Agostinho escreveu a uma virgem consagrada a Deus: "Tens um Esposo que é mais belo que tudo o que existe no Céu e na terra, e que te deu um penhor seguro de Seu amor escolhendo-te para Sua esposa. Podesc oncluir disso quão obrigada estás a pagar o Seu amor". Ó esposa de Jesus Cristo, não te ocupes mais contigo e com o mundo; não pertences mais ao mundo, nem a ti mesma, mas a Deus; e cuida unicamente em viver para esse Esposo que escolheste.


Escolheste a Deus por Esposo, mas primeiramente te escolheu o Senhor para Sua esposa. Quantas almas não deixou Ele no mundo, não lhes concedendo os favores que a ti fez? O Salvador preferiu-te a todas essas almas, não por seres mais digna, mas por te amar mais que às outras. Por isso te diz o Senhor, pela boca do Profeta (Ez 16, 8), que o tempo que te resta de vida é "um tempo para amar". Deves ligar-te a Jesus, teu Esposo, com toda a tua confiança e, com todo o teu amor, prender-te a Ele, que te amou desde a eternidade, que te criou por Sua bondade, e te chamou a Seu santo amor por meio de tantas graças especiais. Por isso, se o mundo solicitar o teu amor, ó esposa de Jesus Cristo, diz-lhe com Santa Inês: "Aparta-te de mim, pábulo da morte. Desejas o meu amor, mas eu não posso amar a mais ninguém do que a meu Deus, que me amou primeiro". "Porque és a esposa de um Deus, diz São Jerônimo, reveste-te de um santo orgulho". Os seculares se orgulham de sua união com pessoas nobres e ricas; tu, porém, podes te gloriar de uma sorte muito melhor, porque te tornaste esposa de um Rei Celeste. Dize, pois, cheia de alegria e santo orgulho: "Achei a quem meu coração ama; prende-lo-ei com meu amor e não O largarei mais" (Cant 3, 4). De fato, é uma imensa felicidade para uma virgem quando ela pode gloriar-se e dizer: "Aquele a quem os Anjos do Céu desejam servir, é meu Esposo. Meu Criador escolheu-me para Sua esposa, e, como Ele é o Rei e o Senhor do mundo, cingiu-me igualmente com uma coroa de rainha".


Deves saber, entretanto, ó esposa do Senhor que lês esses louvores, que não possuis irrevogavelmente essa coroa enquanto permaneceres aqui na terra; poderás perdê-la novamente por tua culpa; para que ninguém ta roube, segura-a fortemente (Apoc 3, 11). Renuncia às criaturas, une-te cada vez mais intimamente a Jesus Cristo pel oamor e pela oração, e suplica-Lhe sem cessar que não permita que te tornes outra vez infiel. Deves dizer-Lhe: Ó Jesus, meu divino Esposo, não permitais que me separe de Vós.


E quando as criaturas quiserem apoderar-se de teu e daí expulsar Jesus Cristo, dize desassombradamente com o Apóstolo, confiada na assistência divina: "Quem me separará do amor de Jesus Cristo? Nem a morte, nem a vida, nem criatura alguma será capaz de nos separar do amor de Deus" (Rom 8, 35).


[Nota: Quando o Santo Doutor fala da santa virgindade, refere-se às almas, tanto das mulheres quanto dos homens]



(SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO, Escola da Perfeição Cristã, compilação de textos do Santo Doutor pelo padre Saint-Omer, CSSR, tradução do padre José Lopes, CSSR, IV Edição, Editora Vozes, Petrópolis: 1955, páginas 186-204 e 338- 343).