Doutrina Social da Igreja
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Apesar de a missão principal da Igreja, que consiste na salvação da humanidade, ser de âmbito essencialmente espiritual, ela formulou uma Doutrina Social da Igreja (DSI). Através de uma análise crítica das várias situações sociais, a DSI pretende fixar princípios e orientações gerais a respeito da organização social, política e económica dos povos e das nações, orientando assim os católicos e homens de boa vontade na sua ação no mundo.85
Através das numerosas encíclicas e pronunciamentos dos Papas, a Doutrina Social da Igreja aborda vários temas fundamentais, como a dignidade humana; as liberdades e os direitos humanos; a família; a promoção da paz e do bem comum no respeito dos princípios da solidariedade e subsidiariedade; o primado da justiça e da caridade; o sistema económico e a iniciativa privada; o papel do Estado; o trabalho humano; o destino universal dos bens da natureza; a defesa do ambiente; e o desenvolvimento integral de cada pessoa e dos povos.363 364
Mas a existência da DSI não implica a participação do clero na política, que é expressamente proibida pela Igreja, exceto em situações urgentes. Isso porque a missão de melhorar e animar as realidades temporais, nomeadamente através da participação cívico-política, é destinada aos leigos.365 366 Logo, a hierarquia eclesiástica está apenas "no negócio de formar o tipo de pessoa que consegue formar e dirigir governos nos quais a liberdade leva à genuína realização humana".367
O pensamento social cristão foi-se desenvolvendo ao longo dos tempos, sendo o início da sua sistematização datada em 1891, ano da promulgação da encíclica Rerum Novarum pelo Papa Leão XIII.85 A DSI rejeita as ideologias totalitárias e ateias associadas ao comunismo ou ao socialismo.368 Além disso, na prática do capitalismo, a DSI recusa, por exemplo, a excessiva e desenfreada miragem do lucro e o primado absoluto da lei do mercado sobre o trabalho humano e a economia.369
Principais críticas
Para além das históricas críticas e divergências entre a doutrina católica e as outras doutrinas cristãs e entre a doutrina católica e a ciência, várias crenças e princípios católicos são também atualmente criticados pelo mundo moderno e até por alguns católicos.370
Como por exemplo, a ética católica sobre o casamento (que na atualidade não aceita o divórcio), sobre a vida (que não aceita o aborto, a eutanásia, o uso de contraceptivos artificiais e a utilização de células-tronco embrionárias para fins científicos que levem à destruição do embrião) e sobre o sexo (que não aceita o sexo pré-marital, a homossexualidade e o uso de preservativos) continuam a gerar muitas polémicas e controvérsias.347 370 As acções escandalosas e imorais, que vão contra a doutrina católica, praticadas por certos membros e clérigos católicos (ex: abuso sexual de menores por membros da Igreja Católica), reforçaram as críticas referentes ao modo como essa doutrina trata a sexualidade.371 372 373
Com a crescente secularização do mundo ocidental, algumas pessoas começaram a pôr em causa a compatibilidade entre a democracia e a doutrina católica e exigiram até o fim de qualquer influência da Igreja sobre a vida pública e sobre as decisões legislativas (nomeadamente sobre a questão do aborto).370
A própria crença em Deus e as regras ético-morais da Igreja são também duramente criticadas como sendo obstáculos para a verdadeira libertação, progresso e realização do homem. Questões mais teológicas como a divindade e celibato de Jesus (com particular destaque às teorias sobre Maria Madalena 374 ), os milagres, a existência de dogmas, a vida eterna, a virgindade de Mariae a paradoxal compatibilidade entre a existência de Deus e a existência do mal e do sofrimento são também questionadas.370 Recentemente, a questão teológica da unicidade e universalidade salvífica de Jesus Cristo e da Igreja Católica254 e a definição teológica de que a Igreja Católica é a única Igreja de Cristo 375 continuam a suscitar várias polémicas e desentendimentos.376Apesar dessas duas crenças, a Igreja Católica nunca negou a salvação aos não-católicos. Questões mais disciplinares da Igreja, como a hierarquia católica, o celibato clerical e a proibição daordenação sacerdotal às mulheres são também temas debatidos na atualidade.370
Em conclusão, a Igreja Católica (e a sua doutrina) é controversa, porque ela "revela-se muitas vezes […] em oposição ao que parece ser o conhecimento vulgar dos nossos tempos", e, também, porque ela insiste sempre que "a fé envolve verdades, que essas verdades envolvem obrigações e que essas obrigações exigem certas escolhas". Por essa razão, a Igreja Católica, "vista do exterior, […] pode parecer de vistas curtas, mal-humorada e atormentadora - o pregador azedo de um infinito rosário de proibições".377
A doutrina católica e a das outras Igrejas cristãs
Igreja Ortodoxa
A doutrina da Igreja Ortodoxa é muito semelhante à da Igreja Católica, visto que ambas desenvolveram as suas principais crenças basicamente a partir da mesma tradição.378 Contudo, existem entre elas várias divergências doutrinárias e disciplinares. Como por exemplo, os ortodoxos só reconhecem os sete primeiros concílios ecuménicos e não aceitam, como por exemplo, o dogma católico da Imaculada Conceição (mas os ortodoxos acreditam na Assunção de Maria 379 380 ); o Purgatório; o primado e a infalibilidade do Papa; a questão do filioque; a falta da epiclese e o uso do pão ázimo (sem fermento) na missa; a comunhão eucarística apenas sob a espécie do pão; o Batismo por infusão (e não por imersão); a forma de administrar o sacramento da unção dos enfermos; o celibato de todo o clero e a indissolubilidade do matrimónio.381
Devido ao recente e grande esforço ecuménico, muitas dessas diferenças foram sendo parcialmente resolvidas ou, pelo menos, diminuídas. O principal problema entre as duas igrejas reside ainda na questão da primazia e da infalibilidade do Papa.381 Mas, mesmo neste campo, houve progressos significativos, que culminaram com a aprovação do Documento de Ravena, no dia 13 de Outubro de 2007. Nesse documento, as duas igrejas reconheceram a primazia papal, ao afirmar que o Bispo de Roma "é o “protos”, ou seja, o primeiro entre os patriarcas de todo o mundo, pois Roma, segundo a expressão de Santo Inácio de Antioquia, é a "Igreja que preside na caridade"".382 Porém, mesmo assim, os católicos e os ortodoxos ainda divergem quanto aos privilégios desta primazia.383
Igrejas protestantes
As Igrejas protestantes adotam, tal como a Igreja Católica, o mesmo Credo Niceno-Constantinopolitano, pelo que a doutrina acerca da Santíssima Trindade e de Jesus Cristo é idêntica à católica. Porém, a diferença entre os católicos e os protestantes noutros temas doutrinais é grande. Genericamente, as divergências mais significativas dizem respeito ao papel da oração e das indulgências;385 à comunhão dos santos; à doutrina do pecado original, da graça e da predestinação; à necessidade e natureza da penitência; e ao modo de obter a salvação, com os protestantes a defenderem que a salvação só se atinge através da fé (sola fide; ver:cinco solas), em detrimento da doutrina católica de que a fé deve ser expressa também através das boas obras. Esta última divergência levou a um conflito sobre a doutrina da justificação.385 386
Há também diferenças importantes na doutrina da Eucaristia e dos outros sacramentos (os protestantes só aceitam a Eucaristia e o Batismo apenas como meros sinais que estimulam a fé 386 ); na existência do Purgatório; no culto de veneração à Virgem Maria e aos santos; na forma de interpretação (com os protestantes a defenderem a interpretação pessoal 387 ou livre-exame das Sagradas Escrituras) e na composição do Cânone das Escrituras; no papel da Tradição oral; na própria natureza, autoridade, administração, hierarquia e função da Igreja (incluindo o papel da Igreja na salvação); no sacerdócio; e também na autoridade e missão do Papa.385 386
Contudo, visto que mesmo entre os protestantes há diferenças consideráveis,387 existem entre eles algumas denominações cujas doutrinas se aproximam bastante da católica. É o caso, por exemplo, de alguns setores do Anglicanismo, que se auto-intitulam de anglo-católicos. Recentemente, o diálogo ecuménico levou finalmente a alguns consensos sobre a doutrina da justificação entre os católicos e os luteranos, através da Declaração Conjunta Sobre a Doutrina da Justificação (1999).388 Além disso, esse diálogo trouxe também vários consensos sobre outras questões doutrinárias importantes, nomeadamente entre os católicos e os anglicanos.389
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